A aprendizagem caleidoscópica na construção do percurso literário de Luiz Valério
Fonte: Divulga Escritor
Por Alexandra Vieira de Almeida
Luiz Valério de Paula Trindade é um autor caminhando no início da estrada que leva à uma cidade plena de criatividade e crescimento. Entre os 12 e 13 anos, como o autor mesmo salientou, teve seu primeiro “caso de amor com os livros” a partir do acesso à grande biblioteca particular de seus familiares. Aqui, encontram-se indícios da vida de tal escritor rastreados na própria literatura, como se a vida e a arte pudessem firmar um diálogo possível. Tal indício pode ser localizado no conto “Felicidade clandestina”, de Clarice Lispector, uma das autoras que influenciou Luiz Valério. A personagem deste conto considerava a sua relação com o livro, como de uma mulher com seu amante. O autor por aqui apresentado se iniciou, como na personagem do conto de Clarice, que tinha amor à leitura, pela trilha do agrado e não do desprazer. O contato inaugural do autor com a leitura foi sublime, cheio de referências com relação ao literário. Tal aspecto prazeroso se reflete nos seus livros que não induzem ao mecanicismo do sistema opressor. Com 15 anos, teve contato com um professor que abriu a literatura por um viés que escapa à obrigação enfadonha que para muitos a literatura aparenta no seu rosto refletido pelo senso comum.
Seu primeiro trabalho individual (Artesão das palavras, 2014) já começa com um tema metanarrativo, a análise do artefato literário, como o trabalho de um artesão que confecciona a linguagem com primor, na sua arte que se direciona cada vez mais para a perfeição. Embora utilize uma linguagem elaborada, enaltece a simplicidade da expressão no seu diálogo tête – à – tête com o leitor, como numa tarde de chá entre bons amigos. Antes de publicar seu trabalho solo, participou de várias antologias, demonstrando uma forma de divulgação de seus textos e apuração da forma em pleno desenvolvimento. No seu site “Luiz Valério – Artesão das palavras” encontra-se a difusão de sua trajetória artística, com a relação de antologias nas quais participou, assim como entrevistas que concedeu a vários meios de comunicação, textos da mídia relatando sobre seus livros, notícias em grandes veículos sobre sua arte literária e veiculação de todas as suas publicações (cerca de 20), com imagens das capas para ilustrar aos leitores a beleza de seu trabalho de artesanato literário fascinante.
Seus livros principais conjugam estilos variados, passando das crônicas (Artesão das Palavras e Ao seu redor), pela poesia (Tempos de Descobertas) e até um ensaio literário-fotográfico (Bancos), revelando o pleno caminhar por estilos que não atentam para o estreitamento do material artístico. Suas obras podem ser encontradas em livrarias de peso.
Em Artesão das Palavras (Scortecci, 2014), o autor se identifica com a leveza e a profundidade do mergulho na beleza da paz atenuante dos conflitos citadinos. Como uma forma de driblar o caos urbano, Luiz Valério preza valores caros ao homem moderno. O ser se torna universal por escapar do meio chocante e frágil. Com sensibilidade aguçada, o escritor leva o leitor para uma viagem inesquecível pelo literário. Italo Calvino, o grande teorizador da “leveza”, assim se expressou, no seu livro Seis propostas para o próximo milênio: “..esforcei-me por retirar peso, ora às figuras humanas, ora aos corpos celestes, ora às cidades; esforcei-me sobretudo por retirar peso à estrutura da narrativa e da linguagem.” O esforço do escritor Luiz Valério ultrapassa o concreto da cidade, levando a linguagem para a plumagem delicada do veio artístico.
No seu outro livro de crônicas, Ao seu redor (Clube de Autores, 2015), ultrapassa, ironicamente, o próprio aspecto temporal e diário do gênero crônica, tratando de temas universais em uma linguagem que perpassa a fluidez e a flexibilidade do papel do escritor, fugindo ao autoritarismo do pseudo-autor que tenta convencer seus leitores na sua linha de raciocínio. O objetivo aqui é fazer do leitor um construtor de ideias num pacto criativo entre narrador e ledor. No Dicionário de Termos Literários, Massaud Moisés apresenta um conceito de crônica que não é o imposto pelo olhar tradicional: “Modalidade literária sujeita ao transitório e à leveza do jornalismo, a crônica sobrevive quando logra desentranhar o perene da sucessão anódina de acontecimentos, e graças aos recursos de linguagem do prosador.” Como bem o escritor Luiz Valério revela com relação a esta obra, o leitor vai encontrar nestas crônicas “uma espécie de oásis literário”.
Seu livro de poesias Tempos de Descobertas (Premedia e-Launch LLC, 2014) revela uma característica que se encontrava presente no gênero trágico da Grécia antiga, o seu valor catártico. Seja aproximando ou distanciando o leitor de suas experiências lírico-subjetivas, há uma identificação dos papéis entre eu lírico e ledor, fazendo a ponte necessária do texto com relação ao universo que o cerca; de dentro e de fora do texto a simbiose pode ser perfeita ou dissonante. Utilizando-se da simplicidade, atinge o intangível, fazendo do simples algo, paradoxalmente, profundo, com reflexões extraordinárias. É o tempo da poesia que nasce no mesmo tempo da interioridade não marcada pela cronologia do diário sacal. Tem-se diante do público um livro de intensa vivência das descobertas do mundo, de forma aprazível e, ao mesmo tempo, clara e precisa, com seu corte mais fundo que a poesia é capaz de trazer para a realidade da experiência.
Em Banco/Benches (Clube de autores, 2015), obra bilíngue português-inglês, tem-se um trabalho original, unindo ensaio literário e fotografia, como um artefato final de um considerável processo de seis anos de muita pesquisa e análise de campo. O objetivo deste ensaio rico e grandioso é focar o olhar em algo que pareceria trivial à primeira vista, a observação de “bancos públicos” do “mobiliário urbano” em oito variadas cidades ao redor do mundo (Cambridge, Edimburgo, Hastings, Lisboa, Londres, São Paulo, Southampton e Vancouver). Ao capturar imagens deste objeto, o leitor sai de sua posição costumeira e confortável para ampliar sua visão numa imagem desfocada, que sem deixar de ser contextualizada e percebida por vários olhares, leva cada pessoa a imaginar um cenário diferenciado e estético para este mobiliário de uso cotidiano na grande urbe. O autor salienta em suas considerações sobre o livro que o método utilizado neste livro é o comparativo. Desta forma, o espectador-ledor pode percorrer vários caminhos para onde levam estas cidades, tendo um olhar descentralizado sobre tais objetos. Portanto, percebendo o percurso trilhado por Luiz Valério, nos seus livros encontram-se espelhos coloridos e multifacetados que se entrecruzam num jogo literário refinado. O diverso e o universal são os reflexos de um mesmo caleidoscópio.
Site do autor:
https://www.luizvalerio.com.br/